
O Ministério Público Federal (MPF) reabriu investigação contra integrantes das Testemunhas de Jeová, após a morte de Paulo Amaro Freire, de 53 anos, diagnosticado com esquizofrenia e tutelado judicialmente, em Bataguassu (MS). O caso está agora sob apuração da Polícia Federal, que irá analisar possíveis crimes como exploração de trabalho, maus-tratos, tráfico de pessoas e instigação ao suicídio. A informação é do Campo Grande News.
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Paulo morreu em dezembro de 2023, após, segundo denúncia da família, anos sendo explorado por membros da congregação local. De acordo com os relatos enviados ao MPF, ele era frequentemente levado para realizar serviço braçal em propriedades vinculadas à igreja, sem autorização da sua tutora legal. A família afirma que, apesar do estado de saúde, era submetido a exaustivas jornadas físicas e à pressão doutrinária.
“Transformaram meu irmão em um trapo humano”, desabafou a irmã de Paulo, que também é sua tutora, em documento registrado em cartório. Ela relatou que, após um período em uma fazenda, ele retornou extremamente debilitado, tendo perdido 13 quilos e apresentando sinais claros de agravamento do seu quadro mental.
Segundo a família, Paulo foi progressivamente isolado do convívio social, abandonando costumes familiares e se submetendo cegamente às ordens dos anciãos da congregação. “Ele deixou de participar de tudo: jogou fora fotos, evitava aniversários, não queria mais votar. Exploraram a fragilidade da sua mente”, afirmou a tutora.
O MPF classificou a narrativa como “detalhada e grave”, justificando a necessidade de investigação mais ampla. A documentação inclui declarações, exames médicos e a certidão de óbito, que atesta a morte de Paulo como “traumatismo do coração por suicídio com faca”.
O procurador responsável destacou que o caso envolve “relatos sérios sobre a exploração de indivíduos vulneráveis, sob a justificativa de serviço religioso”, com potencial para caracterizar práticas criminosas mascaradas de ações doutrinárias.
Além disso, o MPF identificou que o episódio não é isolado. O órgão aponta a existência de outras denúncias semelhantes no Brasil, relacionadas à coação, indução à automutilação e abuso de fé para impor práticas abusivas aos fiéis.
“A estrutura de dominação relatada extrapola o campo da liberdade religiosa e adentra a esfera penal, com possíveis violações aos direitos fundamentais”, frisou o procurador.
A Polícia Federal foi encarregada de reunir provas, ouvir os envolvidos e verificar a eventual ocorrência de crimes como trabalho análogo ao escravo, cárcere privado, instigação ao suicídio e violação dos direitos da pessoa com deficiência.
Até o momento, representantes das Testemunhas de Jeová em Mato Grosso do Sul não se manifestaram sobre o caso.