OPINIÃO

Escute (todo) o seu corpo


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Avós são sensacionais. Elas combinam a percepção do sutil através dos seus corpos, típico do poder feminino, com a sabedoria adquirida com a idade e a experiência. Idade essa, aliás, que também as despe de qualquer melindre ou etiqueta social básica, trazendo o a uma sabedoria simples e direta, seja ela de “sabor” amargo ou doce.

Uma paciente e amiga contou-me que, durante a sua adolescência, ao iniciar um namoro com algum rapaz ela corria até a sua avó para perguntar-lhe se seria com aquele escolhido que viveria o seu amor mais romântico e perene. A avó, sentada em sua cadeira preferida, punha de lado o que tivesse a mão e espichava a coluna arcada para olhar dentro dos olhos da neta.

- “Não, minha filha, de jeito nenhum” – respondia depois de um tempo, bem tranquila, com um veredito preciso e sem direito à apelação. Esta história já rendeu boas risadas entre nós dois.

Existem alguns aprendizados nesta cena: A anciã sabia que o nosso corpo é como o foco de uma antena que capta as mudanças nos delicados campos energéticos que nos rodeiam, evidenciando informações sutis que ali trafegam. Exames de imagem mostram alguma evidência que essas percepções se fixam em algumas estruturas do nosso cérebro, porém suspeitamos que façam processos semelhantes em outras partes do corpo também.

Em outras palavras, o nosso corpo todo sente. Cada parte dele. Uma vez alimentada de percepção, o corpo compartilha e distribui essa informação em forma de energia para todos os órgãos e tecidos, formando os fluxos que os antigos chineses estudaram e levaram à criação dos sistemas de meridianos que estudamos na acupuntura.

Desta forma, o corpo integrado pode expressar um conteúdo simbólico daquilo que percebe, sem necessariamente ar por áreas cerebrais da nossa consciência. Dado a forma súbita e, por vezes, incômoda de como essa expressão ocorre, ocasionalmente ela é entendida como um sintoma de uma determinada doença.

Um bom exemplo deste dilema é o sistema intestinal, um dos mais antigos do nosso corpo, bem direto nas suas manifestações, tal como uma avó sábia. Quase tão enervado e cheio de neurônios quanto o sistema nervoso, o intestino serve para depurar e eliminar o que não nos serve mais.

Caso haja alguma preocupação ou sentimento nos faça sentir sujos e que precisa ser eliminado, mas que somos incapazes de lidar de forma autônoma e consciente, o intestino pode se adiantar em ajudar, fazendo surgir uma diarreia inesperada, associada a períodos de estresse emocional.

A alternância entre constipação e diarreias é bem incômoda e inspira exames para investigar algum processo inflamatório ou de intolerância, as chamadas colites.

Contudo, não raro, os exames são normais, sem lesões anatômicas, ganhando então o diagnóstico de Intestino Irritável. O que isso significa?

Significa que a alteração é um desarranjo do funcionamento do intestino, onde ele responde a estímulos para limpeza que podem não provir somente de alimentos ou de flora intestinal, mas de um sistema nervoso transtornado com percepções que não consegue dar conta sozinho.

Meu conselho, então, é para que nos atentemos aos sintomas do nosso corpo, para além do que é óbvio, pois pode tratar-se de “conselhos” sábios onde o remediar da situação deve incluir entendimento de si mesmo, atenção e atitudes.

Alexandre Martin é médico, especialista em acupuntura e com formação em medicina chinesa e osteopatia ([email protected])
 

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