OPINIÃO

Marina Silva sob ataque

Por Zarcillo Barbosa |
| Tempo de leitura: 3 min
O autor é jornalista e articulista do JC

O vexame proporcionado por senadores da República ao agredirem verbalmente a ministra Marina Silva, mostra a cara da atual Câmara Alta, bem abaixo do que se poderia esperar de uma instituição destinada a ser o ponto de equilíbrio do Congresso.

O bate-boca originou-se na Comissão de Infraestrutura, que convidou a ministra do Meio Ambiente para esclarecer exigências impostas à Petrobras para efetuar pesquisas exploratórias de petróleo na Margem Equatorial do Brasil. Fora da pauta, membros da comissão começaram a ofender Marina Silva pela demora do Ibama em liberar o projeto de nova estrada ligando Porto Velho a Manaus. Os estudos se desenvolvem com cautela, por envolver impactos ambientais que põem em risco uma região rica em biodiversidade, e pobre em proteção à natureza.

O senador Marcos Rogério (PL-RO), incomodou-se com a firmeza das análises técnicas de Marina e, em mau português, soltou um "Me respeite, ministra. Se ponha no seu lugar". Plínio Valério (PSDB-AM) disse que respeitava a mulher, mas não a ministra. Revelava desejos de "enforcá-la". A divergência faz parte da vida democrática, mas ofender é inaceitável. A ministra exigiu desculpas e, como elas não vieram, pegou seus papeis e foi embora. Quando eu era jovem, tinha muita iração pelos senadores Tancredo Neves, Paulo Brossard, Afonso Arinos, Teotônio Vilela. Grandes oradores, de fala elegante e cognição forjada na cultura e visão dos problemas do país. Hoje, a República convive com políticos mal acabados. Para ser eleito basta ser jogador de futebol, influencer ou artista. Todos escolhidos pelo voto, é verdade, mas por razões alheias ao interesse coletivo.

A velha questão da conservação ambiental versus desenvolvimento econômico, é tratada como um dilema. Nos países civilizados, uma coisa não exclui a outra. Elas se completam.

O governo Lula tem sua parcela de culpa nessa agressividade. Há tempos assumiu uma política antiambientalista em favor da aceleração do processo de licenciamento do poço da Petrobras. Nem a empresa estatal reclama. Pelo contrário, procura atender todas as exigências do Ibama de proteção à natureza, em caso de derramamento de óleo. Mesmo assim, todos os dias chegam ao Planalto, pedidos de exoneração de Marina Silva e do presidente do Ibama Rodrigo Agostinho.

O ex-prefeito de Bauru e a ministra estão acostumados a pressões. Lembro-me de quando Rodrigo Agostinho era vereador em Bauru, em 2005, e respondeu perante a Comissão de Ética da Câmara, pelo roubo de três bromélias. Nada de mensalão, mensalinho ou menssalina. Bromélia não se leva na cueca. Espeta. Em vez de prenderem quem estava devastando o que resta da vegetação do município, queriam que o ambientalista sofresse sanções por ter salvo as inocentes monocotiledônias epífitas das rodas do trator que derrubava árvores centenárias, para mais um condomínio.

Ainda seguimos a tradição judaico-cristã, segundo a qual a natureza e os animais irracionais foram feitos para servir aos homens. Está no Gênese: "dominai a Terra e todas as coisas vivas..." Thomas de Aquino, na Summa Theologica, assegurava que não há possibilidade de pecados contra os animais não-humanos ou contra o mundo natural. Então, que se danem a Amazônia, a Mata Atlântica, o cerrado e as bromélias.

A salvação do Planeta acontecerá via a ética da estética, dizem os filósofos pós-modernos. Tento explicar ao meu modo: o homem não pode ser reduzido à lógica do utilitário. Prevalece a dimensão mágica, poética e sonhadora do humano. Os ingleses já perceberam que a árvore vale pelo seu conteúdo estético. Ninguém compra nada de madeira que não venha de floresta manejada racionalmente, mediante certificado idôneo. As mulheres já esqueceram os casacos de pele herdados das mães. Não pelo receio de serem linchadas na rua. Desenvolveram horror ao contato.

É a ética pela estética.

Comentários

Comentários